Quando ouvimos um som, não estamos conscientes da quantidade de elementos que estão envolvidos no caminho percorrido pelo som. Começando pela detecção do som que ocorre no nível da cóclea, passando pelo processamento neurofisiológico, que ocorre no nervo auditivo e tronco cerebral até chegar ao córtex auditivo, onde o som é processado cognitivamente, diferentes habilidades são recrutadas para que possamos ouvir com precisão.
Ter a integridade deste percurso é o que garante ao indivíduo compreender o que ouve, ou seja, é o que garante um bom processamento auditivo.
Por isso, o desenvolvimento do processamento auditivo ocorre desde que uma criança nasce e sua especificidade será determinada pelas experiências de interação com o mundo sonoro que ela terá ao longo de sua vida. Estas experiências podem ser o convívio com os diferentes sons da vida no campo, a distinção dos ruídos da cidade, as notas musicais entoadas por diferentes instrumentos, o reconhecimento de vozes, a exposição a diferentes línguas, etc.
Para entender e estudar como processamos o som a ASHA – American-Speech-Language-Hearing-Association, dividiu as diferentes aspectos do som em categorias denominadas de habilidades auditivas.
Porém para que estas habilidades pudessem ser avaliadas por testes padronizados elas foram subdivididas em áreas funcionais gerais.
Assim temos as seguintes funções auditivas:
- Atenção: habilidade relacionada á maneira pela qual o indivíduo atenta á fala e aos sons do seu próprio ambiente. É imprescindível para a seleção de determinados estímulos em detrimento de outros.
- Discriminação: habilidade relacionada capacidade de distinguir características diferenciais entre os sons da fala.
-Associação: habilidade relacionada á capacidade de associar o estímulo sonoro a outras informações já armazenadas de acordo com as regras da língua.
- Integração: habilidade relacionada á interpretação de informações auditivas com informações de diferentes modalidades sensoriais.
- Organização: conjunto de habilidades em sequencializar, organizar e evocar estímulos auditivos.
Portanto quando uma ou mais destas habilidades estão prejudicadas, encontramos pessoas com dificuldade em lidar com as informações que chegam pela via auditiva. Eles ouvem (detectam), porém tem dificuldade em interpretar o que ouviram, caracterizando assim um distúrbio do processamento auditivo.
Para avaliar e constatar um distúrbio do processamento auditivo é preciso realizar um exame com uma fonoaudióloga onde, dentro de uma cabine acústica, será realizado uma bateria de testes auditivos padronizados. Só então, de acordo com os resultados apresentados é que a fonoaudióloga classificará o grau das alterações apresentadas em leve, moderado ou severo.
Não há uma causa específica para o distúrbio de processamento auditivo, mas pode-se dizer que em termos gerais é comum encontrar alteração em indivíduos que:
- Durante a primeira infância tiveram repetidos episódios de otite média, atrapalhando assim a aquisição da linguagem;
- Apresentam problemas congênitos como diabetes e o lúpus eritematoso sistêmico;
- Apresentam problemas psicoafetivos como psicose, autismos e distúrbios emocionais;
- Distúrbios da comunicação humana que se manifestam por desorganização do sistema fonológico, por problemas de voz, de fluência da fala e de leitura e escrita;
- Problemas no sistema nervoso central;
- Déficits cognitivos;
- Transtornos de aprendizagem;
- TDAH – Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade.
Para identificar crianças que possam vir a ter uma alteração do processamento, alguns comportamentos são comuns e podem ser observados, tais como:
1- Relativos à fala:
- Problemas articulatórios com os sons do /r/ /l/ e /s/ /z/;
- Problemas de linguagem envolvendo a estrutura gramatical;
- Dificuldades em contar histórias e dar recados;
- Dificuldade em seguir ordens;
- Compreensão prejudicada em ambiente ruidoso;
- Dificuldade em compreender palavras com duplo sentido, piadas e ditados populares
2- Relativos a comunicação escrita:
- Inversão da posição da letra na palavra escrita;
- Trocas de letras entre surdas e sonoras;
- Letra “feia” (disgrafia);
- Dificuldade de compreender o que lê;
- Dificuldade em organizar a linguagem escrita.
3- Relativo ao comportamento social:
- Distração;
- Desorganização;
- Agitação;
- Ansiedade e impaciência;
- Impulsividade;
- Tendência ao isolamento;
- Baixa auto-estima.
4- Relativo ao desempenho escola:
- Baixo desempenho em várias matérias;
- Problemas de memória;
5- Relativo a audição:
- Atenção auditiva prejudicada;
- Dificuldade de compreender em ambiente ruidoso;
- Dificuldade em acompanhar uma conversa com muitas pessoas falando ao mesmo tempo;
- Repetem muito “há?”, “o que?”
Depois de identificado e diagnosticado o distúrbio do processamento auditivo, o profissional capacitado para trabalhar na reabilitação é o fonoaudiólogo.
O trabalho pode ser realizado com estímulos feitos em cabine acústica e com estimulação dirigida em terapia fonoaudiológica com uso de material apropriado.
Mesmo a criança passando por trabalho fonoaudiológico, é preciso que os professores e os pais sejam orientados para facilitar e impulsionar a melhora da criança.
Assim em sala de aula é recomendado que:
- A criança faça uso de tampão quando necessário;
- Diminuir o nível de ruído e de reverberação do som;
- Sentar a criança longe de paredes, portas, janelas e ruídos de rua ou pátio;
- Falar próximo á criança e de frente pra ela;
- Ao explicar uma matéria, utilizar frases curtas e com entonação vocal;
- Permitir e auxiliar a criança a fazer anotações organizadas;
- Manter contato com o fonoaudiólogo, facilitando a compreensão do problemas e a utilização de estratégias facilitadoras em sala de aula.
Em casa é recomendado que:
- Os pais auxiliem o fonoaudióloga no exercício diário de estimulaço das habilidades auditivas;
- Sempre que falar com a criança, garantir sua atenção, chamando-o pelo nome ou tocando-o antes de começar a falar;
- Usar frases curtas, claras e objetivas;
- Enfatizar a entonação vocal;
- Repetir a mesma ordem quantas vezes for possível, procurando segmentar a informação;
- Para assegurar que a criança entendeu a ordem, pedir para repetir o que foi solicitado;
- Incentivar a criança a fazer lista de palavras que inicie ou termine com determinado fonema;
- Inicialmente quando iniciar os estudos o ambiente deve ser silencioso, passando aos poucos a inserir ruídos como música instrumental, depois musica cantada, ocuções de radio, pessoas conversando, conforme a criança apresente respostas adequadas para isso.